BRI - O Futuro da Avaliação do Peso
Há quase 200 anos, uma fórmula criada pelo estatístico belga Adolphe Quételet revolucionou a forma como enxergamos o peso corporal. Essa fórmula, que divide o peso pela altura ao quadrado, se tornaria, nos anos 1970, o famoso Índice de Massa Corporal (IMC). Amplamente conhecido e utilizado internacionalmente, o IMC serve como um norte para profissionais de saúde avaliarem se alguém está abaixo ou acima do peso. No entanto, apesar de sua popularidade, o IMC possui limitações significativas. Ele não diferencia massa muscular de gordura, podendo classificar atletas musculosos como "obesos" – um exemplo clássico é o de Arnold Schwarzenegger, que, em seu auge como Mr. Universo, tinha um IMC de 30.2, indicando "obesidade", mas uma cintura minúscula de menos de 86 cm, enquanto o IMC não capturava a composição muscular.
Além disso, o IMC falha em considerar a distribuição da gordura corporal, não refletindo a diversidade racial, étnica, etária, sexual e de gênero, pois suas classificações foram baseadas majoritariamente em dados de homens brancos. Para indivíduos mais velhos, o IMC pode subestimar riscos ao não identificar a substituição de massa muscular por gordura abdominal. É nesse cenário que surge uma "nova matemática" na avaliação do peso: o Índice de Redondeza Corporal (BRI), uma equação mais precisa que vem ganhando protagonismo, especialmente na identificação de riscos cardiovasculares.
O que é o Índice de Redondeza Corporal (BRI)?
O Índice de Redondeza Corporal (BRI, do inglês Body Roundness Index) é uma métrica desenvolvida para avaliar a composição corporal de forma mais abrangente e precisa. Ele foi elaborado em 2013 pela matemática Diana Thomas e sua equipe, e seu nome já entrega sua essência: mede quão "redonda" ou "circular" uma pessoa é.
Diferentemente do IMC, que se baseia em um modelo cilíndrico do corpo, o BRI modela o corpo humano como uma elipse ou um ovo, e quantifica o grau de sua circularidade ou excentricidade. A grande inovação do BRI reside no fato de que, além da altura, ele incorpora a medida da cintura em seu cálculo. Essa inclusão permite que o BRI reflita melhor a proporção de gordura no corpo e entre os órgãos. Seu objetivo principal é estimar a gordura total e, mais crucialmente, a gordura visceral, aquela que se acumula ao redor dos órgãos internos.
Por que a Gordura Abdominal é o "Assassino Silencioso"? A Vantagem do BRI.
A gordura acumulada na região abdominal, conhecida como gordura visceral, é considerada o "denominador mais perigoso" para a saúde cardiovascular. Esta gordura envolve órgãos vitais como o fígado e é metabolicamente ativa, produzindo substâncias que influenciam negativamente o metabolismo e o sistema cardiovascular.
O BRI, ao integrar a medida da cintura, consegue refletir de forma mais acurada a presença e a quantidade dessa gordura perigosa. A importância de mapear essa gordura é imensa, pois ela está intimamente ligada ao desenvolvimento de diversas doenças graves:
• Resistência à insulina, um fenômeno que abre caminho para o diabetes tipo 2.
• Predisposição a infartos e derrames.
• Hipertensão (pressão alta) e colesterol alto.
Conforme o Dr. Wenquan Niu, um dos autores seniores de um estudo sobre o BRI, a deposição excessiva de gordura visceral é como um "assassino silencioso à espreita" em nosso corpo, que pode se manifestar ao longo dos anos com poucos sintomas perceptíveis, mesmo em pessoas aparentemente magras. Dessa forma, o BRI oferece uma ferramenta valiosa para identificar esses riscos precocemente.
O que a Ciência Diz: Validação e Descobertas do BRI.
Desde a sua concepção, o BRI tem sido objeto de diversos estudos robustos que buscam validar sua eficácia como indicador de saúde. As evidências científicas têm reforçado o seu potencial:
• Risco Cardiovascular e Mortalidade: Uma pesquisa da Universidade de Nanquim, na China, acompanhou quase 10.000 pessoas com 45 anos ou mais. Os resultados, publicados no Journal of the American Heart Association, mostraram que números mais altos no BRI estavam associados a um risco até 163% mais elevado de complicações cardiovasculares e mortes. Outro estudo, publicado no JAMA Network Open em 2024, que acompanhou quase 33.000 adultos nos EUA por 19 anos, revelou uma associação em forma de U entre o BRI e a mortalidade por todas as causas. Isso significa que tanto BRIs muito altos (6.9 ou mais, com risco 49% maior) quanto BRIs muito baixos (abaixo de 3.41, com risco 25% maior) foram associados a maior mortalidade em comparação com a faixa intermediária (4.5 a 5.5). BRIs muito baixos, especialmente em idosos, podem indicar desnutrição, atrofia muscular ou inatividade.
• Síndrome Metabólica e Outras Doenças: O BRI tem se mostrado um bom indicador de síndrome metabólica. Um estudo de 2021 com mais de 17.000 adultos chineses, publicado no BMC Cardiovascular Disorders, concluiu que o BRI é um indicador superior para associar-se ao risco cardiometabólico, apresentando uma associação mais forte com fatores de risco cardiometabólicos acumulados após o ajuste de covariáveis. Este mesmo estudo demonstrou que o BRI possui capacidade preditiva específica para triglicerídeos elevados na população geral e para ácido úrico sérico elevado em mulheres. Outras pesquisas também confirmam que o BRI pode ser superior ao IMC para identificar o risco de hipertensão, dislipidemia e hiperuricemia, especialmente em mulheres chinesas. Além disso, o BRI foi eficaz na previsão da doença hepática gordurosa não alcoólica (NAFLD).
Como Calcular o Seu BRI
A fórmula para calcular o Índice de Redondeza Corporal (BRI) é, de fato, mais complexa que a do IMC. Ela utiliza a circunferência da cintura (em centímetros) e a altura (também em centímetros). A equação é a seguinte:
Para interpretar o seu resultado, as faixas geralmente aceitas para o BRI são:
• <3,41: Muito magro (associado a maior risco de mortalidade em alguns estudos, possivelmente indicando desnutrição ou atrofia muscular).
• 3,41 a 4,45: Magro a médio.
• 4,45 a 5,46: Médio (considerado a faixa intermediária de menor risco de mortalidade).
• 5,46 a 6,91: Acima da média.
• >6,91: Alto (associado a um risco significativamente maior de mortalidade e complicações cardiovasculares).
Valores BRI típicos para adultos americanos, por exemplo, variam de 3 ou menos (magreza na seção média) a 7 ou mais (redondeza na seção média), com um índice médio de cerca de 5.
É fundamental compreender que o Índice de Redondeza Corporal (BRI) não veio para substituir o IMC, mas sim para complementá-lo. Para a maioria das pessoas, tanto o IMC quanto o BRI podem fornecer resultados semelhantes, indicando um peso saudável ou a necessidade de atenção. No entanto, a força do BRI se revela precisamente nos casos em que o IMC pode "perder" informações cruciais.
O BRI é particularmente útil em situações onde o IMC pode ser enganoso. Por exemplo, atletas com grande massa muscular podem ter um IMC elevado que os classificaria como "obesos", mas seu BRI seria baixo, indicando pouca gordura corporal. Inversamente, um idoso que perdeu massa muscular, mas acumulou gordura abdominal ("barriga"), pode ter um IMC "saudável" que oculta riscos, enquanto seu BRI levantaria uma bandeira vermelha.
Seja o seu IMC ou BRI que indique a necessidade de atenção, é crucial lembrar que esses índices são apenas um dado sobre a saúde de uma pessoa, e não a imagem completa. Eles devem ser considerados em conjunto com outros indicadores importantes, como pressão arterial, níveis de glicose no sangue e colesterol.
Referências
NEWS.MED.BR. Hora de dizer adeus ao IMC? Um substituto vem ganhando apoio: o índice de redondeza corporal (BRI).
WIKIPEDIA. Body roundness index.
YALE MEDICINE. BMI or BRI? How to Assess Your Body Weight.